terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

O Facebook usa você Por Lori Andrews em 07/02/2012 na edição 680


Na semana passada, o Facebook repassou ao governo documentos que lhe irão permitir a venda de ações ao público. Calcula-se o seu valor em, pelo menos, 75 bilhões de dólares. Porém, ao contrário de outras megacorporações, não haverá um inventário de dispositivos, eletrônicos ou não, carros ou telefones. O inventário do Facebook consiste de informações pessoais – as suas e a as minhas.
O Facebook ganha dinheiro vendendo espaço publicitário às companhias que nos querem alcançar. Os anunciantes escolhem palavras-chave ou detalhes – como o status de relações, a localidade, as atividades, os livros preferidos e o emprego – e então o Facebook publica os anúncios, dirigindo-os ao subconjunto de seus 845 milhões de usuários. Se você indicar que gosta de pasteizinhos, que mora em determinado bairro e convidou seus amigos a visitá-lo, pode esperar que um anúncio de uma padaria próxima à sua casa apareça em sua página. A magnitude da informação online que o Facebook tem disponível sobre cada um de nós para marketing dirigido é assustadora. Na Europa, a legislação dá às pessoas o direito de saberem o que as empresas têm sobre elas, mas isso não ocorre nos Estados Unidos.
No ano passado, o Facebook arrecadou 3,2 bilhões de dólares com publicidade, 85% de sua arrecadação total. No entanto, o inventário de informações do Facebook – e sua receita com publicidade – é insignificante, se comparado a alguns outros. Em 2011, o Google arrecadou um montante mais de 10 vezes superior, calculado em 36,5 bilhões de dólares em receita publicitária, analisando o que as pessoas enviavam pelo Gmail e o que procuravam na web, e utilizando essas informações, em seguida, para vender anúncios. Centenas de outras empresas também entraram com reclamações contra informações pessoais online depositadas em softwares chamados cookies, ou outros mecanismos de busca instalados em computadores pessoais ou em seus navegadores. Se você mencionou ansiedade numa mensagem eletrônica e fez uma busca no Google pela palavra “stress”, ou começou a usar um medicamento que monitora seu humor, pode esperar por anúncios de medicamentos e serviços para tratar de sua ansiedade.
Estereótipo vivo e bem de saúde
Os anúncios que pipocam em sua tela (chamados de pop up) podem parecer úteis ou, na pior das hipóteses, irritantes. Mas são muito mais do que isso. Os bits e bytes sobre sua vida podem ser facilmente utilizados contra você. Se você se candidata a um emprego, a um crédito ou a uma apólice de seguros, seus dados podem ser baseados numa duplicata digital de sua imagem – e você nunca irá saber por que foi recusado.
Informações materiais extraídas da internet já foram usadas contra pessoas que lutam pela custódia dos filhos ou que se defendem em casos de crime. A LexisNexis tem um produto chamado Accurint for Law Enforcement que dá aos agentes do governo informações sobre o que as pessoas fazem nas redes sociais. O serviço da Receita Federal procura, no Facebook e no MySpace, provas de sonegação do imposto de renda, assim como a localização do sonegador.
Os serviços de imigração norte-americanos [United States Citizenship and Immigration Services] são conhecidos por examinarem minuciosamente fotos e posts para confirmar relações familiares ou desfazer falsos casamentos. Às vezes, empresários decidem se contratam alguém baseados em seus perfis online – e um estudo aponta que 70% dos empregadores e profissionais de recursos humanos nos Estados Unidos recusaram candidatos com base nas informações obtidas online. Uma empresa chamada Spokeo armazena informações online para empresários, para o público e para quem quiser. A empresa até coloca anúncios dizendo “Empregadores de RH – Cliquem aqui agora!” e pede às mulheres que entreguem os endereços eletrônicos de seus namorados para analisarem suas fotos online e suas atividades e saberem se “ele está enganando você?”
O estereótipo está vivo e bem de saúde em termos de agregação de informações. Seu pedido de crédito pode ser recusado não com base em suas finanças ou seu histórico de crédito, mas com base em informações agregadas àquilo que teriam feito pessoas cujos gostos e desgostos sejam semelhantes aos seus. Se guitarristas ou casais que se divorciam descumprem mais facilmente seus compromissos com os cartões de crédito, então o fato de você ter visto um anúncio de guitarras ou ter enviado uma mensagem a um advogado que trata de divórcios pode provocar uma agregação de informação classificando-o como menos merecedor de crédito. Quando um cidadão, morador em Atlanta, voltou de sua lua-de-mel, descobriu que seu limite de crédito diminuíra de 10.800 dólares para 3.800. Essa mudança não se deveu a nada que ele tivesse feito, mas às informações agregadas. Uma carta da empresa disse-lhe: “Outros clientes que usaram seus cartões de crédito em estabelecimentos onde recentemente você fez compras têm um histórico de pagamento ruim com a American Express.”
Práticas raciais discriminatórias
Embora a legislação permita que que as pessoas questionem informações falsas nos relatórios de crédito, não existem leis que obriguem os agregadores de informações a revelar o que sabem sobre você. Se eu entrar no Google com a palavra “diabetes”, para um amigo, ou “drogas para estupro”, para um romance policial que estou escrevendo, os agregadores de informação deduzem que aquelas buscas refletem minha saúde e minhas tendências sexuais. Uma vez que não existem leis que regulamentam o tipo de informação que esses agregadores podem coletar, eles próprios fazem as regras.
Em 2007 e 2008, a empresa NebuAd, de publicidade digital, contratou seis provedores de serviços na internet para instalarem um hardware em suas redes que monitorava as atividades online dos usuários e transmitia as informações para análise e marketing aos servidores da NebuAd. Numa média de seis meses, a NebuAd copiou todos os e-mails, as buscas na web e as compras feitas por cerca de 400 mil pessoas. Outras empresas, como a Healthline Networks Inc., têm limites internos com relação às informações que coletam. A Healthline não utiliza informações de buscas feitas por pessoas sobre HIV, impotência ou distúrbios alimentares para anúncios, mas utiliza informações sobre distúrbio bipolar, incontinência urinária e ansiedade, que podem ser problemas tão passíveis de estigmatização quanto os tópicos na sua lista protegida.
Na década de 1970, um professor de Comunicação da Universidade Northwestern chamado John McKnight popularizou a expressão redlining (circunscrever em linhas vermelhas) para designar a incapacidade de bancos, agências de seguros e outras instituições em oferecer seus serviços aos bairros centrais da cidade. A expressão teve origem na prática de autoridades bancárias, que desenhavam uma linha vermelha num mapa, indicando onde não iriam investir. Mas o uso do termo se expandiu, passando a cobrir um amplo conjunto de práticas raciais discriminatórias, como a de não oferecer empréstimos para aquisição de moradia por afroamericanos – mesmo aqueles que fossem ricos ou de classe média.
Sonhos podem ser destroçados
Atualmente, o mapa utilizado para redlining não é um mapa geográfico, mas o mapa de sua navegação pela web. A expressão weblining descreve a prática de recusar oportunidades às pessoas com base em seus dados digitais. Você pode ter recusado seu seguro de saúde com base numa busca que você fez no Google sobre condições de saúde. Você pode receber um cartão de crédito com um limite inferior, não em função de seu histórico de crédito, mas em função de sua raça, sexo, ou código de endereçamento postal, ou do tipo de sites que você visita na web.
A agregação de informações também tem implicações sociais. Quando jovens, moradores de bairros pobres, são bombardeados com anúncios de escolas comerciais, seriam eles mais propensos a abandonar a universidade do que outros de sua idade? E quando se mostram às mulheres artigos sobre celebridades, em vez das tendências do mercado de ações, seriam elas menos capazes de desenvolver o conhecimento de finanças? Os anunciantes estão desenhando novas linhas vermelhas, limitando as pessoas ao papel que a sociedade espera que elas desempenhem.
As práticas da agregação de informações entram em conflito com aquilo que as pessoas dizem que querem. Uma pesquisa sobre relatórios de consumo feita em 2008 com 2.000 pessoas revelou que 93% delas achavam que as empresas digitais deveriam sempre pedir permissão antes de usarem informação pessoal, e 72% queriam ter o direito de sair do rastreamento online. Um estudo feito em 2009 por pesquisadores da Universidade Princeton (Princeton Survey Research Associates) utilizou uma amostra aleatória de 1.000 pessoas e revelou que 69% delas achavam que os Estados Unidos deveriam adotar uma lei que desse às pessoas o direito de saberem tudo o que um site da web sabe sobre elas.
Precisamos de uma lei antirrastreamento semelhante àquela antichamadas telefônicas. Não se trata apenas de meu jantar ser interrompido por uma chamada de telemarketing. Trata-se de meus sonhos poderem ser destroçados por uma porção de bits e bytes sobre os quais não tenho controle algum e a respeito dos quais as empresas, até o momento, não se pronunciam.
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[Lori Andrews é professor de Direito na universidade de Chicago-Kent e é autor de I Know Who You Are and I Saw What You Did: Social Networks and the Death of Privacy]

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