quinta-feira, 23 de junho de 2011

A criação da ''Concursobrás' 22 de junho de 2011 | 0h 00

- O Estado de S.Paulo
Para tentar evitar novas trapalhadas administrativas com o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), como as que resultaram no vazamento das provas nas edições de 2009 e 2010, o Ministério da Educação (MEC) propôs a transformação do Centro de Seleção e Promoção de Eventos (Cespe) - vinculado à Universidade de Brasília (UnB) - numa empresa estatal. Por 36 votos contra 6, além de 4 abstenções, a proposta foi aprovada pelo Conselho Universitário da UnB. Agora ela será convertida em projeto de lei e submetida ao Congresso.

O Cespe foi criado para preparar os vestibulares dos cursos da UnB e, com o tempo, passou a implementar projetos de avaliação educacional e a promover concursos para as mais variadas carreiras da administração pública. Com 78 servidores da UnB e 410 prestadores de serviço, o órgão teve em 2010 um faturamento de R$ 271 milhões, dos quais cerca de R$ 54 milhões foram repassados para a universidade.

Nos últimos anos, o Cespe coordenou o processo de escolha de funcionários de bancos estatais e de profissionais das áreas técnicas e administrativas do Banco Central, Serpro, Correios, Polícia Federal, Inmetro, Sebrae, Ministério da Saúde, CNPq, Advocacia-Geral da União e Tribunal de Contas da União (TCU). Também prestou serviços para a OAB, preparando os exames de habilitação profissional da entidade, e para o Poder Judiciário e o Ministério Público.

Quando teve problemas com a licitação para a escolha do órgão encarregado de aplicar o Enem de 2010, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) recorreu a um consórcio formado pelo Cespe e pela Fundação Cesgranrio, do Rio de Janeiro - uma instituição criada em 1971 para promover os vestibulares de 12 universidades.

O crescimento do Cespe se deu a partir de 1994, graças aos projetos de modernização da administração pública formulados pelo antigo Ministério da Administração e Reforma do Estado, no governo de Fernando Henrique Cardoso, e foi impulsionado pelo grande número de concursos públicos promovidos durante o governo do presidente Lula.

Para o MEC, a transformação do Cespe no Centro Brasileiro de Seleção e de Promoção de Eventos - uma espécie de "Concursobrás" - poderia reduzir os problemas que o Inep sempre enfrentou com licitações para a preparação e aplicação do Enem e do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade). "Não é salutar ficar licitando a cada ano uma empresa sem experiência que pode colocar em risco todo o processo de avaliação", disse o diretor do Cespe, Ricardo Carmona, antes da reunião do Conselho Universitário da UnB. Além disso, a conversão do Cespe em empresa estatal pode ajudar o órgão a regularizar sua situação no TCU, que encontrou várias irregularidades no pagamento de gratificações a funcionários.

Para aceitar a proposta do MEC, a UnB impôs algumas condições - como o direito a um mínimo de 10% do faturamento da empresa (apesar de ela ser custeada pela União) e a possibilidade de ser contratada sem licitação, pela administração pública, em razão de seu "objeto social". Além disso, a UnB pretende que o Cespe continue gozando de imunidade tributária, mesmo sendo convertido em empresa estatal.

Para resolver um problema, o MEC está criando outro, pois a "Concursobrás" seria uma ficção jurídica, gozando das vantagens de uma empresa estatal, em matéria de primazia de venda de serviços ao poder público, e dos benefícios de uma fundação educacional, em matéria tributária. Além disso, a "Concursobrás" açambarcaria o mercado, pondo fim à salutar concorrência entre as fundações surgidas nos meios universitários e que atuam na mesma área do Cespe.

Reproduzindo todos os males e vícios das empresas estatais, a começar pelo fato de que pretende substituir os 400 prestadores de serviço por funcionários concursados, a "Concursobrás" parece ser mais uma iniciativa desastrada do MEC - entre tantas outras que têm sido cometidas na gestão do ministro Fernando Haddad.


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