Michael Wines, The New York Times - O Estado de S.Paulo
Erguendo-se imponente na praia de Bohai Sea, nos arredores da cidade, a Usina Elétrica e de Dessalinização de Beijiang é uma maravilha tecnológica de US$ 4 bilhões: um gerador a temperaturas ultraelevadas, movido a carvão, dotado de moderníssimos controles de poluição, acompanhado por um avançado equipamento israelense que utiliza o calor residual para destilar água do mar transformando-a em água potável.
Existe apenas um problema na usina de 26 bilhões de yuans: a produção de água dessalinizada custa o dobro do preço pelo qual ela é vendida. Não obstante, o proprietário do complexo, um conglomerado estatal chamado S.D.I.C., se prepara para quadruplicar a capacidade da usina, tornando a China a maior produtora de água dessalinizada do mundo. "Alguém precisa perder dinheiro", disse Guo Qigang, o gerente geral do complexo. "Nós somos uma empresa estatal, e ela é nossa responsabilidade social." Em alguns países, essa seria considerada uma loucura econômica total. Na China, é uma estratégia econômica.
Como aconteceu no caso dos painéis solares e com as turbinas eólicas, o governo decidiu tornar-se uma força em mais um setor florescente relacionado ao ambiente: fornecer ao mundo água potável. O projeto de Beijiang, a sudeste de Pequim, fortalecerá a competência da China no processo de dessalinização, o aperfeiçoamento dos aspectos econômicos contribuirá para a criação de uma base industrial e, no médio prazo, reduzirá a escassez crônica de água em Tianjin. O fato de esses investimentos também irem embora como água - pelo menos por enquanto - não é uma grande preocupação. "As motivações políticas são mais importante que as econômicas", disse Olivia Jensen, especialista na política de água da China e diretora da Infrastructure Economics, uma empresa de consultoria sediada em Cingapura. "Se o governo central afirma que a dessalinização será uma importante área de interesse e que destinará recursos para a tecnologia da dessalinização, seguramente o fará."
Por determinação do governo, a China está rapidamente se tornando um dos mercados de maior crescimento do mundo em água dessalinizada. O principal objetivo é quadruplicar a produção até 2020, partindo dos atuais 680 mil metros cúbicos diários para nada menos que 3 milhões de metros cúbicos, equivalentes a cerca de mais 12 usinas de 200 mil toneladas diárias, como a que está sendo ampliada em Beijiang.
O recente plano quinquenal da China para o setor deverá ordenar a criação de uma indústria nacional de dessalinização, segundo Guo Yozhi, que preside a Associação de Dessalinização da China. Institutos existentes em pelo menos seis cidades chinesas pesquisam o desenvolvimentos de membranas, a tecnologia na qual se baseiam as técnicas de dessalinização mais sofisticadas e econômicas. A Comissão Nacional para o Desenvolvimento e a Reforma, a mais alta agência de planejamento da China, está elaborando planos para dar tratamento preferencial a companhias nacionais que constroem equipamentos de dessalinização ou requereram patentes para tecnologias de dessalinização. Acredita-se que haverá incentivos fiscais e empréstimos a juros baixos para incentivar a produção interna.
Guo disse que o papel do governo na dessalinização é "simbólico", porque os investimentos públicos diretos em projetos que usam água do mar não ultrapassam 10% do seu custo. Em comparação, ele afirmou, grandes empreendimentos hídricos, como o Projeto de Desvio da Água Norte-Sul, que desviará a água do Rio Yang-tse-kiang do sul para o norte do país, onde a água escasseia, são completamente financiados pelo governo. No entanto, os planos do governo poderão significar um investimento de 200 bilhões de yuans, ou US$ 31 bilhões, de empresas estatais, agências governamentais e parceiros privados.
Há diversos motivos para a China querer uma indústria nacional de dessalinização, e principalmente a possibilidade de produzir a própria água potável. A demanda de água aqui deverá crescer 63% até 2030 - mais do que em qualquer outro país do mundo, segundo a Asia Water Project, uma organização que fornece informações para empresas.
O norte da China sofre há muito tempo com a escassez de água, e cidades em grande expansão como Pequim e Tianjin já utilizam amplos programas de reciclagem e conservação para atender às necessidades.
Em Tianjin, considerada uma cidade modelo em matéria de conservação de água, 90% da água utilizada na indústria é reciclada; 60% dos sistemas de irrigação agrícola usam tecnologias que economizam água; 236 quilômetros de tubos para a reciclagem da água correm por baixo da cidade. Os apartamentos em uma área de 25.900 quilômetros quadrados da cidade têm duas torneiras, uma para a água potável e a outra para a água reciclada destinada a outros usos.
A usina de Beijiang abastece diariamente um bairro em expansão com 10 mil toneladas de água dessalinizada, e pretende futuramente bombear 180 mil toneladas. Uma segunda usina de 100 mil toneladas abastece uma outra vasta usina de produção de etileno fora da cidade.
Mas a planta de Beijiang tem enfrentado alguns problemas. A água destilada isenta de minerais carrega a ferrugem dos canos da cidade antes de chegar às torneiras, o que torna a água marrom. Alguns habitantes desconfiam dessa água, afirmando que sua pureza significa que ela carece de nutrientes. A usina procura agora sanar o problema acrescentando minérios à água.
Mas para alguns, saciar a sede da China pode trazer um efeito paralelo benéfico para objetivos maiores. O mercado global da tecnologia da dessalinização mais que quadruplicará até 2020, para cerca de US$ 50 bilhões anuais, previu no mês passado a empresa de pesquisas SBI Energy, e as secas cada vez mais frequentes em todo o mundo parecem garantir um crescimento ainda maior. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
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