EMPREENDIMENTOS DE MÉDIO E GRANDE PORTES: A OBRIGATORIEDADE DE ELABORAÇÃO E ADOÇÃO DE UM PLANO DE GESTÃO GEOLÓGICO-GEOTÉCNICA
Os colegas geotécnicos (engenheiros geotécnicos e geólogos de engenharia) que me lêem por certo tem testemunhado pessoalmente casos de empreendimentos (dos mais variados tipos) que em sua implantação estão a cometer erros geotécnicos crassos, os quais, por sua natureza, agridem nossa racionalidade técnica e nossa consciência profissional.
Com a esperada retomada do crescimento econômico nacional, multiplicam-se os empreendimentos nos mais variados setores de nossa atividade, e na mesma proporção tem-se multiplicando as situações referidas, onde percebe-se que os procedimentos técnicos aplicados ficam distantes e apartados do grande conhecimento que a Geotecnia brasileira produziu e acumulou ao longo das últimas décadas.
Esse paradoxo entre o grau de excelência em quantidade e qualidade do conhecimento disponível e a mediocridade do conhecimento realmente aplicado em um grande número de empreendimentos, pelos enormes prejuízos econômicos, patrimoniais e institucionais que vêm impondo à sociedade brasileira, à administração pública e aos empreendedores públicos e privados, em mais um triste espetáculo de generalizada impunidade, está a merecer uma atenção maior e de caráter resolutivo por parte dos geotécnicos brasileiros, de suas entidades técnico-científicas e dos órgãos de fiscalização profissional.
Obras viárias urbanas, intermunicipais e interestaduais, empreendimentos urbanos de caráter comercial, cultural ou lazer, serviços e obras de drenagem e saneamento, serviços e obras de irrigação e adução hídrica, depósitos e centros logísticos de distribuição peri-urbanos, instalações industriais, loteamentos e condomínios habitacionais ou empresariais, grandes obras prediais, etc., fazem parte do grande elenco de empreendimentos que vêm negligenciando os devidos e imprescindíveis cuidados geotécnicos.
Ruptura de taludes, processos erosivos e assoreadores, recalques em fundações, variações críticas do nível freático local e regional, abatimentos de terrenos, comprometimento de instalações de vizinhança, deterioração precoce de infraestrutura pública e privada, acidentes durante e após a implantação da obra, incompatibilidade entre solução adotada e problema objeto, etc., são algumas das comuns decorrências da referida negligência. Há que se considerar também os prejuízos envolvidos no contínuo comprometimento da imagem da engenharia brasileira.
Como solucionar esse paradoxo tecnológico estabelecido pela não utilização prática e plena do conhecimento e da experiência geotécnica disponível? Não como a única providência nesse sentido, mas creio firmemente que o estabelecimento da obrigatoriedade de empreendimentos de médio e grande portes apresentarem, como condição para obter seu Alvará de Construção, um Plano de Gestão Geológico-geotécnica, elaborado e assinado por empresa ou profissional para tanto formalmente credenciado, constitua-se em uma virtuosa decisão. Esse Plano deverá demonstrar todos os estudos, avaliações e decisões de caráter geológico-geoténico adotados para que a implantação e futura operação do empreendimento não apresente deficiências dessa ordem. De tal forma que fiquem perfeitamente expressas as responsabilidades profissionais envolvidas em eventuais problemas que possam vir a ocorrer durante e após as operações de implantação física do empreendimento. O Plano não envolveria os projetos geotécnicos que se façam necessários propriamente ditos, mas sim a previsão de todos os projetos e medidas de caráter geotécnico que deverão ser observados e desenvolvidos desde a concepção até a entrega operacional do empreendimento. Constituiria, assim, um expediente de gestão e planejamento, com claro caráter preventivo.
Obviamente, esse é o arcabouço da idéia proposta, há vários detalhes a serem bem resolvidos, como a definição exata do caráter de médio e grande portes dos empreendimentos, quais seriam as instituições credenciadoras de empresas e profissionais habilitados à elaboração e implementação do Plano de Gestão Geológico-geotécnica, quais as condições para esse credenciamento, qual seria o ordenamento mínimo desse Plano, os órgãos fiscalizadores, as penalizações, etc.
Um bom primeiro passo para aprofundamento do tema e formalização de uma primeira proposta seria a constituição de um Grupo de Trabalho por parte da ABMS - Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica e a ABGE - Associação Brasileira de Geologia de Engenharia.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
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